segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Andança



Andança
(Argentino Vidal)

Andando pelas ruas da cidade
Vi crianças entorpecendo seus destinos
Enquanto eu revelava o meu medo incoerente
Elas revelavam nosso abandono desumano

Os vi dormindo pelas frias noites nas calçadas
Ou nas escadarias das catedrais santificadas
Pois onde antes seus pomposos adros davam abrigos
Hoje se tornaram locais sagrados gradeados.

Lá o amor de Cristo tão pregado não é pra todos.
Preferem não olhar pra estes esquecidos
Lá onde os reis da terra serão eternos
Só por cuspirem palavras ritmadas tão divinas

Eu vi meninas vendendo sua essência
Na luta mercenária da sobrevivência
Pois enquanto muitos vivem aqui o paraíso
Outros comem seus restos apodrecidos

Eu vi mendigos implorando compaixão
Empunhando seu pedido por um pão
Pois enquanto uns temperam seu salmão
Outros vivem apenas do que caiu do chão

Eu vi mendigos arrastando seu quinhão
Empilhando restos velhos descartáveis.
Enquanto temos nossas vidas confortáveis
Pra eles ela pregou um papelão.

Por que não podemos dividir um pouco mais?
Por que será que somos assim tão egoístas?
Precisamos urgentemente irmanar um pouco mais?
Em vez de só cuspirmos palavras ritmadas tão divinas
Antes que seja tarde, tarde demais.